quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Da Vida encoberta na suposta normalidade - II

"Duma forma completamente inesperada (pois jamais havia sonhado com uma tal coisa) os meus olhos abriram-se e, pela primeira vez na minha vida, tive um relance fugitivo da beleza extática do real... Não vi nenhuma coisa nova mas vi todas as coisas habituais numa luz nova e miraculosa, no que, creio, é a sua verdadeira luz. Percepcionei o esplendor extravagante, a alegria, desafiando toda a tentativa de descrição da minha parte, da vida na sua totalidade. Cada um dos seres humanos que atravessavam a varanda, cada pardal no seu voo, cada ramo oscilando no vento era parte integrante do todo, como tomado nesse louco êxtase de alegria, de significação, de vida inebriada. Vi esta beleza presente em todo o lado. O meu coração fundiu-se e abandonou-me, por assim dizer, num arrebatamento de amor e de delícias... Uma vez pelo menos, no meio do cinzento dos dias da minha vida, eu tinha visto o coração da realidade, eu tinha sido testemunha da verdade"

- Margaret Prescott Montague, Twenty Minutes of Reality, citado em W. T. Stace, Mysticism and Philosophy, Londres, Macmillan, 1960, pp.83-84 e republicado em Michel Hulin, La Mystique Sauvage. Aux antipodes de l'esprit, Paris, PUF, 1993, p.37.

6 comentários:

  1. E assim se chega, num ápice, a contemplar o que na dialéctica ascendente de Platão supõe o árduo caminho do método gradual, que muitas vezes ou quase sempre não conduz senão a um conceito intelectual e abstracto de Beleza...

    ResponderEliminar
  2. É Paulo!
    sobe-se descendo, desce-se subindo... O Parménides também bebia dessa bebedeira. A redondez da coisa deu-lhe cabo da posteridade.
    E nada mais é preciso, sem mais, e sem precisão.
    O que me causa agora confusão é o caminho árduo. Há necessidade disso, ou nisso? É claro que não. E esse é um dos segredos mais belos (sem abstracção). E, depois, a coisa nunca acaba. Quer dizer, nunca começa, ou começa nunca, que é o tempo melhor para começar seja o que for.
    E a normalidade é sempre suposta, não deve ser é imposta. Mas há alguma impostura na autenticidade. Que é uma coisa que não existe, nem coisa é. :)
    Bem...
    Hoje quando os meus alunos de filosofia do 10º ano chegaram à sala logo às 8 e 10 da manhã, deparam-se com o seguinte sumário no quadro: "Socorro, estou em apuros!"
    É claro que não tive coragem de escrever isso no livro de ponto. Escrevi antes: "O que é a estupidez? Introdução ao questionamento filosófico". Acho que consegui que alguns vão ler algumas coisas do Kafka. ;)

    ResponderEliminar
  3. Comovente! Como se pode não chorar ao ler isto!?

    ResponderEliminar
  4. Nós choramos ao ler isto. Nós corremos pelos rostos e nas faces que assim vêem o mundo. Porque a beleza precisa dum rio de inocência como o das lágrimas para se espalhar pelo mundo.

    ResponderEliminar
  5. A estupidez de não sentirmos!

    ResponderEliminar
  6. Muitos parabéns! ... Um grande abraço! Hoje é também o dia do abraço que no dia do aniversário, em vez de receber dá!Ontem ou antes de ontem foi o dia do sorriso. Não sei quando será o dia da lágrima.

    ResponderEliminar