"Tudo é ilusão.
A ilusão do pensamento, a do sentimento, a da vontade.
Tudo é criação, e toda a criação é ilusão.
Criar é mentir.
[...]
A própria ilusão é uma ilusão.
[...]
Só há uma coisa que não pode ser ilusão, porque ela não é criada: é a consciência. Uma só coisa escapa a toda a crítica - a consciência. A consciência não cria, nem é um conceito nosso, porque a não podemos pensar nem como sendo, nem como não-sendo. Pensar, sentir, querer, são ilusões, mas ter consciência não é uma ilusão.
[...]
Temos todos a noção de que há qualquer coisa: isso é falso. Não há; não há nem não há. A própria consciência não existe, mas é a única verdade"
- Fernando Pessoa, "O Desconhecido", in Textos e Ensaios Filosóficos, I, estabelecidos e prefaciados por António de Pina Coelho, Lisboa, Ática, 1993, pp.44-46.
A consciência enquanto verdade não resiste à unidade. A pluralidade é a sua voz multímoda. Assim, a criação é a mentira tanto mais sincera quanto mais mentira ela é.
ResponderEliminarQuanto mais fundo essa mentira for maior a consciência dessa ilusão.
...maior a sinceridade poética
ResponderEliminarA questão é: que consciência é esta ?
ResponderEliminarBonDia,
ResponderEliminarO Desconhecido... será a consciência de que o que conhecemos está muito mal conhecido. Como conhecer o Desconhecido - como avançar numa via iniciática, portanto - se não sentirmos necessidade de ir além do conhecido (esta será a grande dificuldade), se não ousarmos destabilizar e explorar o nosso destino?
Talvez a maior ilusão seja a de pensarmos que fomos criados e não realizamos o empreendimento original e essencial da vida - que é o de nos criarmos a nós próprios.
O meu primeiro comentário foi obviamente retirado do "jogo" da sinceridade poética preconizado por Pessoa. A crição heteronímica como forma de abarcar o todo: «o ser tudo de todas as maneiras», que é uma forma de se desprender de um «eu».
ResponderEliminarPermanece no entanto o critério de verdade que tanto pode existir na consciência que, de facto, não é uma ilusão, mas que, na minha opinião, se revela igualmente na Natureza.
Aquela terá sido a estratégia usada em literatura para o sentido da sua inexistência. O desdobramento como estratégia de esvaziamento do "eu" do autor.
Todos sabemos que o pensamento pessoano se não esgota na via poética.
Vai mais longe o poeta no pensamento gnóstico e na via espiritual. Essa consciência do mistério foi a sua mais funda viagem. É essa também a que devemos compreender, sem a qual a obra de Pessoa correria o risco de se ver amputada e diminuída.