quinta-feira, 20 de março de 2008



os pássaros da minha infância
trago-os presos na gaiola furtiva
da língua de gato noctívago
com que abjuro o nome das coisas
que me prendem a esta humanidade
de estar sempre por cima das pedras
quando os caminhos seguram incertezas
nas suas duas pontas
o perigo de não e ser o que rejeito
e quantas vidas calo
na mudez com que entreolho as pessoas
com que me cruzo
resgatadas por dolorosos instantes
à indiferença de não as saber existentes
com a sua completude ignorada e os seus desejos
e as suas vidas ao sabor das ondas
deste oceano que nos traz
pedaços de vésperas naufragadas
nas uterinas exsudações da memória
são pássaros que roubam aos céus
a perdição de voar
e trazem a cada gesto
a cada movimento com que me apresento na vida
a ausência e o frio de me vestir
como um casulo
sem uma crisálida lá dentro

6 comentários:

  1. Olá Paulo,

    Poderás falar-me um pouco da fotografia que enviaste com o teu poema?

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  2. Luíza, a fotografia foi tirada na Lagoa Azul, numa manhã soalheira e as rosas terão servido para algum feitiço, realizado durante a noite, como é comum nesse local, pois na margem junto às rosas havia uma garrafa, ainda com algum líquido dentro, e velas e mais uns despojos da prática recente desse tipo de ritual.
    Achei graça às rosas à tona do reflexo das nuvens e cliquei... ;)

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  3. Depois de me teres falado da fotografia, que gostei muito de saber, o ambiente em que a encontraste, fui ler o teu poema. E os pássaros da tua infância vieram como rosas a flutuar para junto dos meus. A infância é difícil, tanto há que não se partilha, tantas coisas estagnadas, que não sabemos de que se trata, onde tocam e o quanto nos afectam. Sabes o que te digo?, quando começamos a olhar para eles na gaiola, é quando começamos a perceber que são pássaros. O Céu pertence-lhes.

    Muito obrigada pela fotografia. Tocou-me profundamente. E os pássaros...

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  4. EPÍSTOLA II DO OBSCURO – O RETIRAR DO VÉU


    Época de renascer!...Depois e antes do silêncio, a Palavra. Ela atira aos céus o voo de uma asa que não pertence à distância nem à proximidade. Um puro movimento de asas vibrando na esfera azul, sístole e diástole do que é a vida. Pausa para respirar, dar e receber a harmonia de fundo que vibra nas coisas e nos seres:

    «Nem se perde o corpo ao submergir-se no mundo, nem se perde o sujeito ao descer às raízes de si mesmo (…) O sujeito deixa de aperceber-se como oposto aos objectos e o corpo deixa de ser inerte para ser sujeito (…)»,«Corpo e mente trocam, por assim dizer os papéis, (…) A mente incorpora-se no mundo e o corpo faz-se consciência. Percebe-se então a unidade de fundo de tudo.»
    Mas há a palavra criadora de ficções e de mundos!...Nascimento e morte de mundos outros… O verbo é o ser. Pela palavra fui e sou uma máscara de sombra e de luz… Sem corpo, sem mente, uma voz e um silêncio, um enigma estético, um pensamento sem corpo… uma saudade do céu… Pela palavra me esvaziei e enchi, me iludi e me descobri…nasci e morri…

    Deixar viver as palavras sem boca é criar o mundo através delas, elas nunca foram nossas!... nunca somos só nós… Foi assim que o obscuro sobrevoou a serpente… indo com ela… na sua companhia… Aninhado por muitos que ouviram a palavra que foi sendo palavra de ficção tornada realidade…

    À vista deste céu de rosas brancas…

    SURGE O MOMENTO de desvelar a palavra e mostrar o corpo «Eis o Homem!»…

    O Homem que é mulher e mãe, o corpo de MARIA.

    Um Bem-haja para os Céus da “Serpentinagem”

    Para a Ana Margarida em especial, um Equinócio de sonho.



    O Obscuro desvelado

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  5. MARIA, MAR-IA, MAR ... O essencial, a matriz de onde todos nos vimos ...

    Que esta epoca tao especial seja de renascimento para todos voces!

    Um forte abraco,

    A

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