No Satiricon, de Caius Petronius Arbiter, escrito cerca de 60 d.C., narra-se um banquete, oferecido por Trimalquião, que termina em orgia em que os deleites venusiano-báquicos dão lugar a ditos filosófico-melancólicos: "Dies nihil est (O dia nada é)"; "Dum versas te, nox fit" (Mal nos voltamos, faz-se noite); "Voamos menos do que as moscas (muscae)"; "Não somos mais do que uma bolha de ar (bullae)", diz um dos participantes, suspirando.
Aqui se suspira algo de muito afim ao que atravessa tantas páginas literárias e sapienciais. Citemos, ao acaso:
“Que é a vida ? Um frenesim. / Que é a vida ? Uma ilusão, / Uma sombra, uma ficção, / e o maior bem é pequeno, / que toda a vida é sonho, / e os sonhos sonhos são” - Calderón de la Barca, La Vida es Sueño, II, XIX .
“Tu que existes exposto ao que os dias te trazem, o que é ser alguém ? O que é não ser ninguém ? O humano é o sonho de uma sombra (skiâs ónar anthrôpos)” - Píndaro, Odes Píticas, VIII.
“A vida não é senão uma sombra, / um pobre actor que se pavoneia e agita o seu momento sobre o palco / e depois não mais é ouvido: é um conto / narrado por um idiota, cheio de som e fúria, / que nada significa” - Shakespeare, Macbeth, Acto V, Cena 5.
“Vaidade das vaidades, tudo é vaidade (hebel, vapor, sopro)”; “tudo é vaidade e correr atrás do vento !” - Eclesiastes, 1, 2 e 14.
Será a orgia uma via para a sabedoria ? Porventura. Depende. Mas, para quem o for, ao explodir como bola de sabão, não deixe de o oferecer para que todos assim também se libertem.
Só desta vez, só uma vez, ainda,
ResponderEliminarColhe essas rosas de saudade.
Coloca na jarra os caules
de desiguais tamanhos
E dispõe, assim, de mim, em memória.
Uma folha aponta ao norte,
A mais pequena e frágil;
Para o sul vira a rosa vermelha,
A de sangue e de vida
A outra, branca e triste,
Atira-a para o mar
Onde Ofélia
Ainda deve andar perdida.
Que dessas rosas, tantas,
Que a jarra contém
Possa ficar a mais viçosa,
A rosa do amor,
A que nunca morre
E só em saudade se colhe.
Belo poema, obscuro, ele mesmo uma orgia de desejo pelo infinito, pelo que nunca acaba porque nunca comeca.
ResponderEliminarA rosa do A-mor, victoria sobre a morte, afirmacao da vida.
ResponderEliminarObrigado, Ana Margarida,
ResponderEliminarCompreendeste muito bem a raiz originária desse mesmo amor.
Um soriso:)
Muita ternura
E serenidade
E a orgia, que dizem dela os amantes das rosas... e das palavras ?
ResponderEliminar"Orgia" era o nome dado aos Mistérios gregos. No momento culminante dos Mistérios de Elêusis, na "epopteia" (a "visão omniabrangente"), mostravam-se símbolos dos órgãos sexuais e há quem pense que um sacerdote se unia sexualmente com uma sacerdotisa. Boa parte da linguagem religiosa do Ocidente vem do vocabulário sexual, como o estudou Odon Vallet. Por exemplo, "venerável" e "venerar" vem de "venéreo" e de "Vénus". Porquê ?
ResponderEliminarPois se venerou, vai ter de rezar...
ResponderEliminarNão sei Casto Severo, mas explica lá... tu que percebes destas coisas
ResponderEliminarÉ certo que os "amantes das rosas" não querem saber de ti... mas há outras rosas que te esperam...
ResponderEliminarQue esperam a quem e onde ?
ResponderEliminarEsperam por Casto Severo, aqui mesmo na Serpente ! Que nos fale dos "Mistérios gregos", de Vénus... da generosidade a da compaixão por todos (todos os seres, certo ?), no momento da explosão... "para que assim também se libertem" ...
ResponderEliminartambém estou interessada nestas questões...
ResponderEliminarP.S. Se alguém souber de Casto (Severo ou Sorridente) pedi-lhe que nos esclareça.
Tanta gente interessada na "via para a sabedoria"! Porque será?
ResponderEliminarÓptimo. Hei-de passar por aqui outro dia. Adeus.
Quem és tu Passageiro ?
ResponderEliminarNão ! Não me digas que és Ninguém !